Olá pessoal! Eu sou Júlio Matos, um dos designers responsáveis pelo jogo Goddess Save the Queen, anunciado pela Redbox Editora. Este texto busca ajudar a responder a pergunta que mais recebemos após o anúncio (afinal, esse jogo é um RPG?), e é o primeiro de alguns artigos que pretendemos falar sobre os diários de design do #Goddess (guarda a hashtag aí!). 😀
Em parte pelo fato da Redbox ser essa máquina de lançamentos que abrange também o mundo dos board games, esta dúvida esconde uma questão interessante sobre o cenário brasileiro de jogos de contar histórias (e talvez mundial, só que em outros lugares já começaram a resolver a questão).
Desde os primórdios desse tipo de jogo, ainda quando engatinhava para longe dos “War Games” (jogos de batalha entre exércitos miniaturizados em escala), há diversas controvérsias sobre como classificar ou categorizar os jogos. Inclusive, se você quiser ter uma dimensão mais clara da origem deste problema, recomendo enormemente a leitura do livro “Playing at the World” de Jon Peterson.
Ao que nos cabe, a ideia de RPG chegou ao Brasil capitaneada já por seu expoente no exterior (o qual a existência se confunde com o sentido do próprio nome da categoria), o Dungeons & Dragons, que acabou reforçada por outros títulos que ganharam versões em português, como GURPS e a linha Storyteller durante os anos 90. Graças a algumas matérias nas saudosas revistas de video game, muitas delas assinadas pelo Marcelo Cassaro, muitos iniciantes (incluindo eu) puderam ter os primeiros contatos com o hobby. Nessa época, não havia questionamento sobre a nomenclatura, pois os jogos disponíveis carregavam semelhanças muito evidentes: Personagens com estatísticas numéricas, nichos definidos, habilidades quantificadas, um “Mestre” ou “Narrador” bem delimitado e vários outros aspectos.
Com o passar do tempo – e isto é uma característica de praticamente qualquer segmento – novas abordagens nasceram, principalmente através de fóruns e publicações independentes. Neles, diversos jogos traziam regras e abordagens que quebravam alguns pilares de similaridade, fazendo com que muitos acreditassem se tratar de algo diferente. Por serem estranhos em dinâmicas e abstrações, abdicando da figura do Narrador ou mesmo abstraindo valores para quantificar os personagens, diversos termos começaram a buscar um modo de reclassificar esse jogos. GM Less e Story Games são alguns termos que foram aceitos e já são comuns lá fora. Aqui no Brasil é comum usarem o termo “Jogos Narrativos” ou até mesmo “Jogos Indie”, para classificar jogos que não compartilham similaridades, em algum aspecto, com aqueles que já eram mais familiares à comunidade de jogadores.
Perceba que nenhuma dessas nomenclaturas busca eliminar o nome “RPG” da classificação (mesmo que alguns designers prefiram abominar a sigla e manter distância dela), transformando estas alcunhas, nas quais podemos talvez agregar outras como “Old School”, em subclasses de um mesmo nicho, já que as características mais básicas do RPG em si são o que interligam, de alguma forma, as dinâmicas desses jogos. Em resumo, parece simples para quem conhece um RPG entender as semelhanças e diferenças de um “Jogo Narrativo” e muito pouco importa a forma como classificamos um jogo quando nós o desenvolvemos. Essa acaba sendo um prerrogativa de quem lê e joga os jogos.
Portanto, Goddess Save the Queen é sem dúvida um jogo de contar histórias, focado em uma Narrativa de Aventura e que pode ser considerado RPG por compartilhar diversos aspectos destes jogos clássicos. Mas dizer que ele é simplesmente RPG, pode quebrar a expectativa de quem o conhece, pois a sigla já tem um significado impregnado pelo tempo e vivência de cada um. Se você conhece e gosta muito de RPG, tem grandes chances de gostar do Goddess por suas semelhanças com aquilo que lhe é comum. E pra você que gosta de jogos que propõe novas abordagens, ele também tem diversas novidades que vão estimular e ampliar sua visão e possibilidades para seu jogo!
Um abraço e até nosso próximo diário de design! 😀